Em cinzas pela segunda vez


Famílias novamente perdem tudo em incêndio três anos depois de fogo ter destruído casas sob viaduto no Sampaio. Moradores vão receber aluguel social e Prefeitura do Rio vai começar a mapear as favelas sob estruturas viárias

POR PAULA SARAPU - O Dia - 29/05/2010
Rio - A doméstica Rosângela Augusto, 42 anos, deixou Minas Gerais para tentar vida melhor no Rio. Instalada na Favela Dois de Maio, sob o viaduto de acesso ao Túnel Noel Rosa, no Sampaio, ela viu tudo o que conquistou virar cinzas em incêndio que atingiu diversas casas há três anos. Ontem, Rosângela acordou com o mesmo pesadelo: cerca de 25 barracos foram destruídos pelo fogo. Ninguém se feriu, mas muitos ficaram apenas com a roupa do corpo. A estrutura de dois pilares do elevado acabou comprometida, e o trânsito no viaduto continua interditado. A prefeitura vai começar a mapear as comunidades sob viadutos.
Foto: Carlos Eduardo Rodrigues
 / Agência O Dia
Barracos em chamas sob o viaduto no bairro de Sampaio | Foto: Carlos Eduardo Rodrigues / Agência O Dia
Segundo os moradores, o Município prometera remover a comunidade no incêndio de 2007. Com três laudos de interdição destruídos ontem, Rosângela estava indignada. “Você só tem tempo de salvar a sua vida, o resto fica. Passei por três recadastramentos e nada aconteceu. Perdi tudo daquela vez, morei na rua à espera da remoção e, como não tinha para onde ir, construí outro barraco de madeira. Até quando vai ser esse descaso?”, questionou a doméstica, que salvou a mãe e os dois cachorros.

>>FOTOGALERIA: Incêndio sob viaduto no bairro Sampaio

Sob o viaduto, vivem 250 famílias, segundo o subprefeito da Zona Norte, André Santos. De acordo com ele, a comunidade já estava na lista das favelas que serão removidas este ano. “A Dois de Maio seria a sétima, porque não havia risco iminente. Ela podia esperar mais um pouco”, afirmou.

As famílias ficarão abrigadas na Vila Olímpica do Sampaio e receberão aluguel social de R$ 400 por tempo indeterminado — com adiantamento de três meses. Todos serão incluídos no programa ‘Minha Casa, Minha Vida’, e a área sob o viaduto será ocupada pela Comlurb. “Estamos reassentando desde o ano passado. Esse problema não se resolve do dia para a noite”, afirmou o prefeito Eduardo Paes.

Karina Mariano, 11 anos, segurava o único bem que lhe sobrou: a mochila de princesa. Ela tinha ido para a escola pouco antes. “Minha mãe está trabalhando e vai ficar muito triste”, disse a menina.

Viaduto atingido deve ser liberado hoje com restrições

Por causa do incêndio, a Rua Ana Néri e o viaduto que liga Vila Isabel ao Jacaré, foram interditados. O elevado e a alça de acesso pela Rua 24 de Maio permanecerão fechados porque, segundo a Defesa Civil, dois pilares foram afetados. O túnel está liberado pelas agulhas de acesso e saída da Rua Marechal Rondon. Por dia, cerca de 30 mil veículos passam pela área.

A Defesa Civil informou não haver risco de desabamento, mas é necessário escorar os pilares atingidos e recompor o reboco de cimento, o que vai demorar uma semana. O viaduto deve ser liberado hoje apenas para veículos leves, com sinalização para reduzir a velocidade.

Comunidade tem até amanhã para deixar as casas

As 53 famílias vizinhas do pedreiro Marcelo Pereira, que morreu quinta-feira no desabamento de sua casa, no entorno da Colônia Júlio Moreira, em Curicica, têm até amanhã para deixar seus imóveis. Ontem, os moradores começaram a retirar seus pertences. 

“Todo mundo está ocupado retirando as coisas, não queremos correr o risco de nossa casa desabar. Ainda não tenho para onde ir, vou ficar na casa de vizinhos, mas bola para frente” disse a moradora Tatiana Silva e Souza, 29, moradora de uma das 46 casas que já receberam o aluguel social de R$400 da prefeitura.

Sobrevivente da tragédia, Micke Pereira, 6 anos, continua internado na UTI do Hospital Lourenço Jorge. Os corpos de Marcelo, 38 anos; a mulher, Silvana da Silva, 28; o filho caçula do casal, Nicolas Pereira, 5, e o primo José Gonçalves, 33, foram enterrados ontem no Cemitério São Francisco Xavier, no Caju.