Um elevado vai ao chão Prefeitura anuncia licitação para que seja demolido o Viaduto da Perimetral


O Globo, Luiz Ernesto Magalhães, Luiz Gustavo Schmitt e Jacqueline Costa, 16/jul
O prefeito Eduardo Paes anunciou ontem que, entre meados de 2012 e o início de 2013, após a construção de um mergulhão, terá início a demolição da estrutura entre a Rodoviária Novo Rio e o Mosteiro de São Bento, que deve durar um ano. O bota-abaixo do paredão cinzento, que vem sendo discutido por urbanistas e políticos há quase 20 anos, foi antecipado ontem por Ancelmo Gois em sua coluna no GLOBO.
A obra faz parte da segunda fase do Projeto Porto Maravilha, que ganha, a partir de hoje, em cerimônia no Galpão da Cidadania, na Saúde, injeção de R$ 3,5 bilhões em recursos a serem liberados pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
- O dinheiro entra imediatamente em caixa para a prefeitura investir nos projetos do Porto Maravilha. O mais caro é a demolição do Elevado da Perimetral - disse Paes.
A verba viabilizará uma ParceriaPúblico-Privada planejada há mais de um ano pela prefeitura. O edital de licitação será lançado no fim do mês. O secretário de Desenvolvimento Econômico, Felipe Goes, explica que a empresa que vencer a licitação será responsável por uma série de intervenções estruturais no Porto, que devem começar no primeiro semestre de 2011 e ser concluídas antes dos Jogos Olímpicos, em agosto de 2016. Os recursos para as obras serão repassados para a concessionária, que receberá uma espécie de taxa de administração, a ser paga pela própria prefeitura.
- Temos um compromisso com o Comitê Olímpico Internacional (COI) de entregar essa área revitalizada para as Olimpíadas. Além disso, na área serão construídas as vilas para os árbitros, o centro de mídia não credenciada, entre outras instalações - disse Goes.
A lista de obras inclui a construção de um nova via paralela à Avenida Rodrigues Alves para desafogar o tráfego. A iniciativa privada ficará responsável por implantar uma terceira faixa na via. No trecho entre o Mosteiro de São Bento e a Rodoviária Novo Rio, o trânsito seguirá por um mergulhão de 900 metros. Além disso, 40km de ruas serão reurbanizados. Durante os 15 anos do contrato - renováveis por mais 15 -, a concessionária será responsável pela manutenção da área, incluindo limpeza e iluminação.
A vencedora da PPP também já deixará pronta a infraestrutura para a implantação de duas linhas de Veículos Leves Sobre Trilhos (VLT) que circularão pelo Centro. A escolha do operador do serviço será alvo de outra licitação, ainda sem data.
- A demolição do Elevado da Perimetral será por etapas. Faremos isso à medida que as novas alternativas para o trânsito forem concluídas.
Na concorrência, vamos escolher qual a empresa ou consórcio oferecerá a melhor proposta técnica e de remuneração pelos serviços - explicou Goes, acrescentando que trecho do elevado entre o Mosteiro de São Bento e o Aeroporto Santos Dumont será mantido por ficar fora da chamada Área de Especial Interesse Urbanístico da Zona Portuária.
Felipe Goes explicou ainda que a entrada de recursos do FGTS permitirá a aceleração de obras já previstas.
O dinheiro será aportado no fundo imobiliário da Companhia de Desenvolvimento Urbano do Porto (Cdurp), administrado pela prefeitura.
A previsão era que esse fundo só começasse a ser capitalizado em setembro, data prevista pelo município para lançar no mercado os chamados Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cpacs) De posse de Cpacs, que terão valor de face de R$ 2,5 bilhões, investidores poderão construir prédios acima de gabaritos mínimos propostos para a região do Porto, em negócios conhecidos como Operações Urbanas Consorciadas. A arrecadação irá recompor investimentos do FGTS e financiar mais obras de infraestrutura. A participação do fundo se tornou possível com uma decisão tomada no fim de junho pelo Conselho Curador, permitindo que os recursos sejam aplicados em operações urbanas consorciadas.
- A parceria com o FGTS já assegurou recursos para o Porto. E ajuda para a prefeitura decidir a estratégia de oferecer Cpacs em leilões públicos para garantir a melhor rentabilidade - explicou o secretário.
Projetos incluem dois museus
A primeira etapa das obras do Porto Maravilha teve início no fim do ano passado, com o lançamento de um pacote de mais de R$ 100 milhões.
Fazem parte do projeto a construção, no Píer, do Museu do Amanhã, projetado pelo arquiteto Santiago Calatrava, e.a implantação do Museu de Arte do Rio (MAR) no Palacete Dom João VI, na Praça Mauá, entre outras iniciativas.
- A restauração do Palacete Dom João VI já começou, assim como a restauração dos Jardins do Valongo. Também já demos início à implantação de uma nova rede drenagem de várias ruas da Saúde, que também fazem parte do projeto - disse Goes.
Em geral, arquitetos, urbanistas e historiadores são a favor da derrubada do Elevado da Perimetral, que classificam como um crime contra a arquitetura da cidade. Porém, mesmo entre os que apoiam a medida, há quem se mostre preocupado com as transformações viárias acarretadas pela demolição. É o caso do arquiteto e antropólogo Lauro Cavalcanti, diretor do Paço Imperial. Para ele, o contato da cidade com o mar nunca deveria ter sido cortado, mas é preciso esgotar o estudo de alternativas que não prejudiquem o já complicado trânsito do Centro da cidade: - Acho ótima a ideia de refazer o tecido urbano, mas contanto que sejam criadas alternativas viárias.
Se a Perimetral for derrubada e a Avenida Rio Branco for fechada aos carros, como ficará o trânsito? O diretor do Paço Imperial acrescenta que a demolição seria ainda mais bem-sucedida se fosse de todo o viaduto, e não só a parte que vai da Praça Mauá até a Avenida Francisco Bicalho, como prevê a Prefeitura. Presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil, Sérgio Magalhães, concorda: - Sob o ponto de vista arquitetônico e ambiental, é muito positiva a recuperação dessa frente marítima. Tão importante quanto a demolição do trecho da Praça Mauá é a derrubada do viaduto em frente à Praça Quinze, que merece o mesmo tratamento. A Perimetral causa danos paisagísticos, culturais e ambientais para a cidade.
Antônio Agenor Barbosa, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), também mostra preocupação com a questão viária e de transportes: - Se essa ideia da demolição vier ligada a políticas de restrição do uso do automóvel e a alternativas, será bem vinda. Na atual lógica, o elevado é fundamental porque é ligado a acessos à Linha Vermelha, à Avenida Brasil e à Ponte Rio-Niterói.
Além disso, acho que será empregado muito dinheiro para uma cidade que tem favelas que precisam ser urbanizadas, postes caindo, bueiros explodindo e jardins mal cuidados.
José Luiz Alquéres, presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro, acredita que a derrubada do viaduto será excelente para as atividades econômicas e para novos usos residências e culturais: - O Centro da cidade passou por um processo de degradação quando a função residencial e a qualidade de seu urbanismo foram violentadas pela passagem de vários corredores de tráfego. Particularmente, a Perimetral barra o acesso do carioca ao contorno do litoral, que deveria ser a área mais nobre e valorizada, com restaurantes e serviços. Tudo isso se submeteu à tirania do automóvel.