Marco da arquitetura colonial brasileira, Fazenda Colubandê é invadida e saqueada

16/05/2015 - O Globo

Juiz federal dá prazo para estado e Iphan apresentarem projeto de restauração de imóvel tombado em 1940

POR PAULO ROBERTO ARAÚJO


Na piscina da Fazenda Colubandê, restos de computadores, lixo e água estagnada. Ao fundo, o painel de Djanira. - Eduardo Naddar / Agência O Globo

NITERÓI — Descrita por historiadores como um marco da arquitetura colonial brasileira, a Fazenda Colubandê, construída em 1618, em São Gonçalo, foi invadida e saqueada por vândalos. A invasão e o furto das peças históricas ocorreram antes de o juiz federal Fábio Tenenblat ter dado uma sentença, no último dia 6, fixando prazo de 120 dias para que o governo do estado e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) apresentem projeto de recuperação do patrimônio. A fazenda foi tombada em 1940 pelo Iphan. Está abandonada desde 2012, quando foi desativado o Batalhão de Polícia Florestal da PM, que funcionava ali.

Com a saída do batalhão, o 7º BPM (São Gonçalo) assumiu a responsabilidade de manter a vigilância na Fazenda Colubandê, que também tem em seu conjunto a Capela de Santana. Nos últimos meses, contudo, a guarita onde era feito o controle de acesso foi abandonada. O cenário no interior da capela e da fazenda é desolador. Os cadeados e as fechaduras das portas foram arrombados; mobiliário, lustres, torneiras, disjuntores e peças centenárias desapareceram; há preservativos em quase todas as salas, inclusive na capela, e vestígios de fogueiras nas salas e na masmorra.

Na Capela de Santana, há rachaduras por todos os lados; parte do teto desabou; as peças do altar foram furtadas e só resta um dos mais de 20 bancos de madeira. Pequenas imagens de santos foram colocadas por umbandistas no que resta do altar. A piscina foi transformada em depósito de lixo e água estagnada. Na parte externa, estudantes se reúnem para namorar no chamado Bosque da Saudade, onde cada árvore representa um policial morto em defesa do meio ambiente. O ambientalista Vilmar Berna encaminhou novas denúncias do Ministério Público Federal (MPF) depois de visitar a fazenda na semana passada:

— É um triste fim para a casa colonial mais bonita e completa do Brasil. Todas as peças da capela já foram retiradas, as portas, arrombadas, e os vidros, quebrados. Agora, estão raspando a pintura dourada do altar pensando que é ouro.

MURAL DE DJANIRA AMEAÇADO

Ainda estão preservados os azulejos portugueses no interior da Capela de Santana e o mural de Djanira, pintado em 1960, em homenagem às mulheres. Como todos os fios foram furtados, não há iluminação em todo o complexo, de 122 mil metros quadrados. Nos fundos, fora do sítio histórico, funciona uma vila olímpica administrada pela prefeitura de São Gonçalo. Funcionários informaram que PMs fazem rondas eventuais.


Só sobraram os azulejos portugueses no saque à histórica Capela de Santana - Divulgação/Vilmar Berna

— O quadro de destruição da fazenda comprova que a memória do Brasil está sendo jogada no lixo, literalmente. Com o abandono, o país perde um pouco das referências do Brasil Colônia e do Brasil Império. Saquearam a nossa História — lamentou o historiador Paulo Santos, que preside o Centro de Estudos Paulo Lamego.

A luta pela restauração da Fazenda Colubandê é antiga. Depois de várias tentativas frustradas para recuperar o patrimônio, o procurador da República Lauro Coelho Júnior (atual procurador-chefe do MPF) impetrou ação civil pública, em julho de 2012, contra o governo do estado e o Iphan, cobrando a restauração do patrimônio. Em abril de 2013, a Justiça Federal determinou a restauração, mas o estado não cumpriu. Dois anos depois, o juiz Fabio Tenenblat foi duro na sua sentença, destacando que questões burocráticas não podem impedir o cumprimento de ordem judicial. Ao fixar prazo para que o Estado e o Iphan apresentem o projeto de restauração, ele observa que não serão aceitos pedidos de novos adiamentos: "Decorrido o prazo, deverá ser reiterada a intimação do Estado do Rio para que comprove o cumprimento da decisão judicial, sob pena de responsabilização penal e administrativa dos servidores que deram causa ao descumprimento, bem como fixação de multa pessoal".

JOGO DE EMPURRA

O comandante do 7º BPM, coronel Fernando Salema, informou que o policiamento é feito apenas no entorno da fazenda e que a PM não tem responsabilidade pelas instalações do prédio, "que pertence ao Iphan". O órgão federal informou que já alertara o governo do estado, "proprietário do bem", sobre risco de invasões e depredações enquanto não houver uma destinação para o imóvel. Fiscais do Iphan estiveram no local e constataram a falta de segurança que, segundo a nota, facilita a entrada de traficantes e de qualquer pessoa. O MPF informou que recomendou ao estado, por meio da Secretaria estadual de Cultura, que providencie a vigilância do imóvel. A Cultura, porém, afirmou que não é responsável pela fazenda. A Secretaria estadual de Planejamento garantiu que o estado vai cumprir a decisão judicial e vai restaurar o patrimônio.

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