Poluição na Baía de Guanabara: cariocas e turistas apostam no desgaste da imagem do Rio

07/05/2015 - Jornal do Brasil

População lamenta cenário degradante, mostra preocupação com a imagem no exterior e culpa governo

Cláudia Freitas

Entre cariocas e turistas, uma opinião é unânime: se a Olimpíada deixará legados para o Rio de Janeiro, certamente um deles será manchar a imagem mundial de Cidade Maravilhosa, principalmente em função da degradante poluição na Baía de Guanabara - cartão-postal que será palco de competições. Na terceira reportagem da série, o Jornal do Brasil foi às ruas entrevistar a população e visitantes que estão de passagem pela cidade sobre o assunto. A avaliação das opiniões é desanimadora.

Luiz Guilherme Vasco, morador da cidade, aposta no conceito de que o turista, quando escolhe o Rio, com certeza é pela sua beleza natural. "E este quesito ambiental [poluição na Baía de Guanabara] pode impactar a visão que ele tem da cidade", opina. Para ele, pelo pouco tempo até a realização dos Jogos, dificilmente a cidade vai conseguir reverter este quadro crítico, o que pode representar uma decepção para o turista que está com a passagem reservada para o Rio. "Uma pessoa que vai para um lugar e é bem tratada, gosta dos lugares, a tendência é que ele volte para trazer os seus familiares ou curtir o que ele gostou da primeira vez. O turista internacional, particularmente aquele que vem da Europa, que tem uma despesa maior de viagem, se ele encontra uma decepção ligada à criminalidade, à questão ambiental, isso pode ser um empecilho para retornar ao país", acrescenta.

Wagner Oster: "Não acredito que tudo vai se resolver a curto tempo, mas com certeza deveriam, porque é papel deles e ganham para isso"
Wagner Oster: "Não acredito que tudo vai se resolver a curto tempo, mas com certeza deveriam, porque é papel deles e ganham para isso"

A turista paulista Daiane da Conceição Costa Trindade acha que a poluição vai provocar uma imagem muito ruim não só do Rio, mas do país. "No Rio de Janeiro, apesar de ser uma cidade bonita, os turistas acabam vendo somente a poluição e levando isto para fora. A imagem é de uma cidade suja", diz. Daiane lamenta não ter um maior investimento das autoridades em campanha de conscientização, visando manter a cidade limpa. 

A peruana Annye Piaf, de 35 anos, está há quatro anos no Rio de Janeiro e observa com muita tristeza a degradação da Baía de Guanabara e seu entorno. Ela aponta que a cidade vai receber uma demanda muito grande de visitantes no período das Olimpíadas e muitos deles devem mudar o roteiro de viagem assim que se deparar com um lugar bem diferente dos cartões-postais que conhecem por fotos. "Eu mesma adoro a praia, mas não entro mais no mar porque está muito sujo", conta. Ao descrever a imagem do Rio no exterior, Annye afirma que as pessoas idealizam a cidade como "algo muito bom, com praias e belezas". No entanto, a realidade constatada na sua rotina é de uma orla imunda, com muito lixo e em processo gradativo de piora e maior violência, como assaltos, em decorrência de ações ineficientes da prefeitura.

Maíra dos Santos, turista de São Paulo, está em sua primeira viagem ao Rio e acredita que a imagem que ela está tendo da cidade será a mesma que outros viajantes vão ter no próximo ano. "O Rio é uma cidade maravilhosa e as pessoas já vêm para ver alguns pontos famosos. Se tem um lugar sujo, claro que é notado", diz ela. A turista, em um passeio pelo Aterro do Flamengo, conta que encontrou lixo no chão e flutuando na baía. "A gente vê que tem pouco investimento. Estes locais que os turistas sempre escolhem estão desta forma. O imagem vai ficar ruim para o país, porque o Rio passa a ser um ponto de referência. Tem que ter investimento. Os turistas vêm para cá [Rio] trazendo um dinheiro a mais, uma renda a mais [para a receita do Rio]. Ele tinha que levar uma imagem bacana", lamenta Maíra. 


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"Infelizmente, os gestores do estado não tomaram as devidas providências no tempo que deveriam ter tomado. A cidade hoje está entregue ao tráfico, aos bandidos e à poluição", lamenta o taxista Cláudio Palma. Para ele, o quadro de calamidade é resultado da negligência das autoridades regionais. "Foi avisado que a Baía de Guanabara deveria ser despoluída desde quando ganhamos o direito de fazer os Jogos Olímpicos. E o que eles [governantes] fizeram? 'Vai dar tempo, vai dar tempo'. E agora não vai dar tempo? Em um ano eles vão conseguir despoluir? Não vão", diz, enfático, o taxista.

Cláudio Palma: "Infelizmente, os gestores do estado não tomaram as devidas providências no tempo que deveriam ter tomado. A cidade hoje está entregue ao tráfico, aos bandidos e à poluição"
Cláudio Palma: "Infelizmente, os gestores do estado não tomaram as devidas providências no tempo que deveriam ter tomado. A cidade hoje está entregue ao tráfico, aos bandidos e à poluição"

Quando a Copa do Mundo foi realizada no Rio, em junho de 2014, o paulista Alves Júnior estava chegando na cidade e decidiu prolongar a sua estadia. Ainda instalado na Zona Sul, ele lembra que naquele período houve uma repercussão positiva da imagem do Rio no exterior, mas pondera que agora este marketing deve ter um resultado bem diferente. "Com os esportes que devem ter na Baía de Guanabara, pelo que já estou acompanhando nos noticiários, não vai haver uma despoluição, como havia sido prometido. A imagem não deve ser favorável", aposta. Ele tem observado que o mau cheiro nas proximidades da enseada tem ficado mais forte a cada dia. "A falha foi dos governantes, que não souberam investir o dinheiro que foi enviado para esta limpeza", considera ele.

Luiz Guilherme Vasco: 'A poluição na baía pode impactar a visão que o turista tem do Rio'
Luiz Guilherme Vasco: 'A poluição na baía pode impactar a visão que o turista tem do Rio'

Wagner Oster, turista de Maringá, no Paraná, se diz triste ao imaginar o retrato que os estrangeiros devem levar do Rio de Janeiro após os Jogos, que para ele será de "lixo flutuante". "Com a mudança da maré, a gente vê muito detrito flutuando na baía. Este fato é muito prejudicial para todos os brasileiros, especialmente para os turistas que vão estar aqui competindo", comenta. Oster veio ao Rio a trabalho e aproveitou o momento de folga para praticar esporte na orla do Aterro. "Correndo aqui na orla, deu pra ver todo esse lixo que a gente vê à distância, nos noticiários. Eu esperava uma passagem muito mais bonita do que eu estou vendo agora. Já tem mais de 20 anos que a gente escuta que as autoridades deviam ter feito algo, até agora nada. Então, não acredito que tudo vai se resolver a curto tempo, mas com certeza deveriam, porque é papel deles e ganham para isso", afirma ele, se referindo ao governo da cidade.  

O suíço Dario Laupp reforça que logo que os turistas chegam ao Aeroporto Internacional, dependendo da maré, já são premiados com "um cheirinho especial", que impede até que a janela do carro ou ônibus seja aberta. E vendo "as coisas flutuando na água", fica uma impressão "meio esquisita". "O estrangeiro gosta de uma paisagem bem cuidada. Eles chegam à conclusão de que a maravilha que a gente tem aqui no Rio não é bem mantida", ressalta ele. Para Laupp, o Rio deve ficar marcado como lugar de abandono, o que representa uma "vergonha" para o povo e as autoridades